Feira de gado do sertão


JORNAL DE ARCOVERDE n.298 – Julho/Agosto de 2017


Feira de gado do sertão


Pedro Salviano Filho



«Nossa feira de gado (foto de 1918 ou 1919). Estendia-se do local em que está hoje a sede das Obras Contra Secas até o oitão da igrejinha de Nossa Senhora do Livramento.»


«Outra vista ainda da mais famosa feira de gado do sertão do estado (1918/1919). À esquerda, o oitão da igrejinha de Nossa Senhora do Livramento. À direita, a entrada da “rodagem” que vai para Buíque.»


«Mais ou menos em 1925, nossa feira de gado foi para o Tamboril, nome originário do vegetal da mesma designação existente naquele local, em Rio Branco. A foto é de 1929 ou de 1930 (Arquivo de Gumercindo Cavalcanti).»
Fotos e legendas acima, do livro Município de Arcoverde (Rio Branco). Cronologia e outras notas. Luís Wilson, Recife, 1982.

«O curral de embarque dos bois para o Recife, nos carros da Great Western, mesmo depois que a feira se mudou para o Tamboril, ficou sendo, durante muitos anos, no local em que está o Bandeirante.» Foto do livro Ícones. Patrimônio Cultural de Arcoverde, Roberto Moraes, 2008, pág. 48


A maior feira de gado do sertão pernambucano durou cerca de 40 anos e promoveu o crescimento da então vila Rio Branco que, junto a outros fatores, induziu sua emancipação do município de Pesqueira. 
Inicialmente, em 1916, ela era realizada onde depois funcionou o DNOCS (https://bit.ly/3fCiiCI), sendo mudada para o “triângulo” e, finalmente, em 1925, para o Tamboril (em frente à casa que pertenceu ao cel. Augusto Cavalcanti- https://bit.ly/3dfahlu). Até por volta de 1945 o embarque do gado pela Great Western era feito num curral onde depois foi construído o cinema Bandeirante. De vários estados chegavam gado para feira, tornando-se rapidamente um importante fator de desenvolvimento da pecuária. Mais dados são captados nesta pesquisa para complementar conhecimentos sobre esta atividade.
Como já vimos nesta coluna (https://bit.ly/2YfiZfx), a partir de 1953 passaram a ser realizadas as Exposições Regionais de Animais de Arcoverde, outro fator preponderante para o amadurecimento da pecuária regional.


1614 - Primeira feira de gado - Os sertaníades. Rinaldo dos Santos, 2017. goo.gl/F8aUBg. «Com o correr do tempo, a exigência cada vez maior de terras para o cultivo da cana-de-açúcar foi expulsando a boiada dos limites da área agrícola. Iniciava-se uma segunda etapa na colonização, na qual existia uma nítida delimitação entre a agricultura e a pecuária, embora seguissem ainda vizinhos e interdependentes.
A primeira feira de gado realizou-se na Bahia em 1614. A pecuária torna-se mais independente, ocupando terras cada vez mais para o interior, pois o desenvolvimento dos rebanhos exigia grandes extensões desbravadas. Os rebanhos destinavam-se à produção de carne, leite e couro ao mercado interno e, também, bois-de-carro para os engenhos e transportes em geral. As feiras de gado surgiam como ligação entre o açúcar e o Agreste-Sertão, sendo um fator de povoamento do interior, reunindo pessoas e gerando negócios. Os Sertões eram, de fato, muito importantes para abastecimento dos engenhos de açúcar. Diz Simonsen corretamente: “Não existiria produção de açúcar sem a pecuária nos Sertões nordestinos”. As secas, porém, desestimavam um projeto de colonização mais abrangente. Somente quando a seca entrava nos engenhos, fazendo declinar a produção do açúcar, os aristocratas conseguiam sensibilizar o Governo para algumas ações de enfrentamento e abrandamento das consequências das longas estiagens. Se a seca, porém, permanecesse restrita aos Sertões, ninguém saberia, a não ser os sertanejos que lá viviam. A seca não tinha data marcada, podia acontecer, ou não e, por isso, a ocupação dos Sertões não foi uma ação planejada pelos que detinham capital. O povoamento dos Sertões não tinha a garantia que o açúcar oferecia, no Litoral e no Agreste e, por isso, aconteceu de forma desordenada.
Desde o século XVII, até meados do século XVIII a pecuária irá ocupar diversas regiões do interior do Nordeste. Na Bahia, o gado foi ocupando as terras do “Sertão de Dentro˜. Em Pernambuco, o gado foi ocupando as terras do “Sertão de Fora”, sempre através dos rios (ou mar), ao longo dos quais se desenvolveram os currais. Os Sertões nordestinos tinham, assim, duas pecuários, a “de  Dentro” (ou originária), que ocupou o Siará, Piauí e Maranhão, e a “de Fora”, que ocupou a Paraíba e Rio Grande do Norte.
De 1580 a 1616, os pernambucanos incorporaram a faixa litorânea que liga Olinda até o Maranhão. A seca entre 1614-1615 suspendeu a guerra contra os índios, fazendo Dias d’Ávila retornar para sua casa, no litoral baiano. Ali seria construída a famosa Tatuapara, ou Casa da Torre, na década de 1620, monumento para a posteridade.
Em 1614 foi lançado o livro “Histoire de la Mission de Péres Capucins en lísle de Maragnon”, de Claude d’Abbeville. Em 1615 sai o livro “Histoire des choses plus mémorables advenues en Moragnon”, de Yves DÉvreux. Os franceses escreviam livros, deixando claro que pretendiam permanecer na terra, mas não conseguiram. Os portugueses escreviam menos, mas combatiam muito mais. Os franceses mostravam livros, os portugueses mostravam seus arcabuzes.»

1809 – Viagens ao Nordeste Brasileiro, de Henry Koster (Volume XVII – Sec. Educação e Cultura, de Pernambuco, Recife-1978, 2ª edição, [Pág. 163]. «O interior de Pernambuco, Rio Grande, Paraíba e Ceará não contém, propriamente, gado selvagem. Duas vezes por ano os vaqueiros de várias fazendas se reúnem com o fim de apanhar o gado. As vacas são levadas, de toda a parte, para uma área em frente da casa e aí, cercadas por numerosos cavaleiros, são impelidas para os espaçosos currais. Isto feito, desmontam os homens e se alguma vaca se torna furiosa, como sucede, um laço pelos cornos é bastante para prendê-la bem ou, ainda outro meio é adotado, que é passar o laço numa pata traseira, e trazer a corda enrolando completamente o animal, sendo fácil derrubá-lo. Os bezerros são presos sem grandes dificuldades e marcam-lhe a coxa direita, com ferro incandescente, com que é feito o sinal, anteriormente fixado pelo dono, como sua marca privativa.» 

1856 - 28-8-1957 - Diário de Pernambuco, goo.gl/Ptxtsc , 1ª col. «Há um século. Viagem de boiadeiro. O abaixo assinado [Antonio Gonçalves da Silva], negociante de gado nesta cidade da Vitória, declara que tem comprado desde o 1 de março de 1856, até 22 de agosto do corrente ano, 5.614 bois, assim como consta de seus livros [...]. Nota da redação: Após a Restauração Pernambucana, em 1654, e o abastecimento dos currais de fora no agreste e na parte oriental do sertão de Pernambuco, a localidade de Santo Antão da Mata começou a ter enorme importância, como passagem obrigatória dos que viajavam do Recife para a zona das catingas. Em 1788, o chamado roteiro do Ipojucas incluía Vitória, a 12 léguas de Recife, de onde se alcançava Catinga Vermelha, no rebordo da Borborema, em terras do atual município de Gravatá. Com o tempo, a feira de gado da Vila e, depois, Cidade da Vitória ficou famosa no Nordeste. Há cem anos, por exemplo, o boiadeiro vitoriense Antônio Gonçalves da Silva negociou 5.614 bois em 18 meses, adquiridos no sertão, onde também comprava escravos. As "pessoas do sul", que lhe compravam gado, certamente eram senhores de engenho da parte meridional da nossa zona da mata, onde a agricultura canavieira impedia as atividades pecuárias.»

1900 - Moxotó Brabo, Rio de Janeiro, 1960, Ulisses Lins de Albuquerque, pág. 33. goo.gl/HWKYZG. «Boiadeiros e tangerinos. Na minha infância, um dos grandes dias na fazenda, era quando meu avô (ou meu pai) se dirigia ao curral com seus tangerinos, para abrir a porteira e soltar a boiada a ser conduzida às feiras de gado em São Caetano da Raposa e Caruaru - dali a umas quarenta léguas. O gado ia saindo e espalhava-se pela várzea, enquanto os vaqueiros e tangerinos o rodeavam, até encaminhá-lo para a estrada. Algumas reses ariscas, indóceis, tentavam furar o cerco, e, não raro, uma e mais outras saíam em desabalada carreira, dando trabalho à vaqueirama que as perseguia, por vezes internando-se pelo mato, até trazê-las ao rebanho. E lá se ia o gadão estrada afora, ocorrendo às vezes que as reses da fazenda, ali por perto, começavam a urrar -  chorando decerto a separação. As que seguiam, urravam também… e o pessoal da fazenda sentia-se comovido ante aquela cena, de um certo modo tocante. Os vaqueiros, acostumados a lidar com as vacas e bois da fazenda que seguiam na boiada, não escondiam seu constrangimento, e uns com outros falavam desolados: “Lá se vai a Mimosa velha…” Ou “Coitados do Azulão e do Redondo! Bois velhos bons no arrasto…” E na guia da boiada lá estava o tangerino aboiador, a entoar aquela melopéia dolente: “Ê… boi… ê… ê… boi mansão… ô… vaca bonita… ai… ôi… ê… boi… mansão…” O tom plangente do aboio parecia amansar as próprias reses mais esquivas, e a boiada marchava calmamente, pisando a erva e fazendo rolar os seixos na estrada. Aí os vaqueiros voltavam, despedindo-se dos tangerinos. A propósito, contava-me em Pesqueira o velho Felizardo Mendes, antigo boiadeiro no sertão da Paraíba que, quando trazia as boiadas do Piauí, ao subir a serra da Borborema, como que o gado compreendia ter deixado bem longe os seus pastos, e, voltando-se para o poente, derramava-se num choro, em uníssono, que fazia cortar coração. A urrar, escavando o chão, como que enviava o seu último adeus aos campos natais! Naqueles tempos, os boiadeiros mais afamados eram meu avô (conhecido na estrada por Chico Alves, do Mossoró), meu pai, Chico da Vargem Grande, Chico Vieira, o português Monteiro, de Serra Talhada, Domingos Siqueira, de São José do Egito, major Tenório, de Pesqueira, e alguns mais, de menos categoria. Mais tarde, outros iam surgindo - Antônio Ferraz e Antônio Serafim (Tonho Boiadeiro), de Floresta, Chico Lopes, do Pantaleão, Lula, do Rio Grande, Antônio Zeferino, do Cariri, João de Brito, da Ipojuca (Pesqueira), Quincas Gordo (do Tapuia), Gonçalo Brandão e Campo Verde, de Belém de Cabrobó, Enoch Nogueira e Domingos Rodrigues, da Bahia e tantos outros…
E lá se iam para as feiras. Quantos calotes lhes eram passados! Muitos, precisariam vender, depois, seus gados, das fazendas, para que pudessem reembolsar os fazendeiros das reses adquiridas a crédito para as boiadas. Eram homens de vergonha e não trastejavam no saldar seus compromissos. Lembro-me que meu pai, em 1898, passou noites e noites sem dormir, porque, devendo um pouco, não recebia dez contos de réis de um marchante do Recife - um tal Rapouso - que lhe comprara uma boiada. Só depois de quase um ano foi que o devedor remisso começou a pagar-lhe em prestações, e isso mesmo com a intervenção de Pedro Pernambuco, deputado federal, chefe da política restrita no terceiro distrito, por meu pai dirigida no município… Ainda hoje a situação continua a mesma. Sem nenhuma garantia, os boiadeiros vivem à mercê dos riscos, entregando sua sorte aos marchantes da capital (e aos piabas), registrando-se vez por outra um bolo: prejuízo total, a arruinam-se-los sem apelo ou agravo! E os pobres tangerinos? Pobres coitados! léguas e léguas a pé, tangendo o gado alheio, curtindo o sol escaldante, dormindo ao relento, quase sempre no chão, internando-se pelo mato em busca de alguma rês que lhes prega uma sortida fugindo do bando à noite… É quando há o estouro da boiada? Ah! Só Deus e eles sabem o quanto sofrem, nos lances dramáticos a que se atiram através das catingas espinhentas, na luta tremenda para juntar o gado que um acidente qualquer assustou.
E vêm e vão, e vão e vêm - muitos dos mais longínquos sertões, do Piauí até -, resignados, cantando estrada afora, por vezes soltando piadas, quando à porta de um casebre onde se vende aguardente reúnem-se por um instante para o trago de um gole, como “refrigério”…
Habituados àquela eterna labuta, calejados os pés - e em todos os sentidos também calejados -, velam pela sorte dos patrões - os boiadeiros que os esperam nos dias de feira, e neles confiam cegamente, na certeza de que nenhuma rês, a não ser que haja tombado no caminho, lhes faltará nas boiadas.
E quanto dói, ouvi-los cantarolar, em marcha lenta - pobres que nada possuem de seu - as trovas rústicas que algum deles compôs e correm mundo.[…]»

06-04-1914 - A Província, goo.gl/wX9R8L,  col. «Faz-se em Vitória, conhecida cidade do interior, a feira de gado […]. Ali fui e dali trouxe impressão que me não furtarei de publicar, chamando a devida atenção dos poderes competentes para o modo selvagem por que se tratam os infelizes animais destinados a alimentação pública.[…]»

1916 - Minha cidade, minha saudade. Recife, 1972,  Luís Wilson. Página 131.
«Em 1916, no lugar que está, atualmente, a residência do dr. Ruy de Barros Correia e Adalgisa, onde era a casa de Ernesto Lima, onde ficam, hoje, os edifícios da Obras Contra Secas e imediações, tinha Rio Branco a sua primeira feira de gado. Exatamente onde fica a casa do dr. Ruy, havia, até 1924, ou 1925, um rancho de boiadeiros, almocreves e tangerinos. Recordo-me de outro rancho daqueles no fim do Cuscuz, e de outro, parece-me, na rua dos Mascates.
Nossa feira de gado, das imediações das Obras Contra Secas, saiu para o “Triângulo” e, depois, para o lugar em que está, agora, o cinema Bandeirante. Mais tarde, foi embora para o Tamboril, onde permaneceu até alguns anos passados. Hoje, já não existe mais a grande e tradicional feira de gado.
O curral de embarque dos bois para o Recife, nos carros da Great Western, mesmo depois que a feira se mudou para o Tamboril, ficou sendo, durante muitos anos, no local em que está o Bandeirante. Ali, na quarta feira, embarcavam as boiadas. Era uma noite de trabalho de verdade, ou de trabalho puxado para o pessoal encarregado de meter os bois no trem. Luiz Aleixo era o encarregado dos trens de gado. Vez por outra, um boi mais brabo rebentava o curral, ou o pulava, e saía, cidade a fora, a botar mulher e menino pra correr, pelo meio da rua.
Mas, em 1919, Rio Branco já era, então, uma cidadezinha. Possuía, conforme consta de uma Antologia de Trabalhos de Zeferino Galvão, “590 casas (distribuídas em nove ruas), 1 praça, 1 largo, 2 travessas, 2.000 habitantes na sede, 1 agência de Correio, Estação do Telégrafo, Via Férrea, feira (às quartas-feiras), grande comércio com 57 estabelecimentos, 1 cinema, Luz Elétrica, Liga Contra o Analfabetismo, 1 banda de música, 1 fábrica de goiabada, 1 de bebidas espirituosas, 4 bilhares, 2 cafés, 2 Hotéis, 1 farmácia (deviam ser 2, a “Holanda” e a “Osvaldo Cruz”) , 4 mil habitantes no distrito, 6 fazendas de primeira ordem e 4 quarteirões policiais”.
A primeira feira de gado, no entanto, vinha do local em que estão hoje, os Edifícios das Obras Contra Secas e imediações, até o oitão da Igrejinha de Nossa Senhora do Livramento, na entrada da estrada de Buíque, mandada construir pelo governo, em 1915, para dar comida aos flagelados da seca, a maior, sem dúvida, que já houve até agora, no nordeste.»

1916 - Município de Arcoverde (Rio Branco). Cronologia e outras notas. Recife, 1982. Pág. 84  - «É realizada a primeira feira de gado de Rio Branco, em nossa outrora Rua do Comércio ou Rua Grande, entre o Armazém de Compra de Algodão de “Seixas & Veloso”, a um lado do oitão da Igreja de Nossa Senhora do Livramento e o Hotel de seu Mesquita, logo depois das Obras Contra Secas.
Transferiu-se depois para o “Triângulo”, mais tarde para o local em que está hoje o Cine Bandeirante e mais ou menos em 1925 para o Tamboril, quando era, então a famosa feira de gado do Sertão do Estado.
Vez por outra soltava-se um boi brabo do Tamboril e fechava as ruas de Rio Branco por onde passava.
Chamavam “espacio”, em nossa feira de gado e em todo o sertão, ao boi que tinha os chifres abertos e grandes. Um chifre torto, “corombó”. Curvos para baixo, “combuca”. Muito curtos para dentro, quase se tocando, “redondo”. Se o feitio dos cornos da rês era descomunal, chamavam-lhe “espanhóis”.
Havia, outrora, muitas e muitas estórias de bois, sabidas de cor, cantadas em homenagem aos bichos brabos que viviam como “heróis”, “famosos pela resistência em escapar aos melhores vaqueiros, atravessar as secas, ocultos, famintos e livres, reaparecendo com um halo de invencibilidade que os iluminava de uma glória humilde e teimosa na memória coletiva”, constituindo aqueles romances para Luís da Câmara Cascudo (Tradições Populares da Pecuária Nordestina, Documentos da Vida Rural n. 9, 1956 RJ), a mais alta e realística das constantes do ciclo de nossa pecuária, em sua doce ingenuidade e graça comunicante.
1919 […]. Visita também o filho, Cel. Augusto Cavalcanti (Augusto Mouco), em Rio Branco, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Dr. André Cavalcanti.
Foi para receber o pai que o coronel mandou construir uma de nossas mais belas casas de residência, algum tempo depois vizinha à feira de gado do Tamboril e onde esteve entre os anos de 1932 e 1936, em Rio Branco, as Obras Contra Secas.»

Município de Arcoverde (Rio Branco). Cronologia e outras notas. Recife, 1982.  Pág. 203: «Nossa feira de gado (a famosa feira de gado do sertão do estado, em Rio Branco), no Tamboril, não existe mais, faz 25 ou 30 anos, o nome “tamboril” tendo origem, sem dúvida, no vegetal da mesma designação ali existente. [...] Não se vê também em Rio Branco, há 20 ou 25 anos, um velho boiadeiro ou os seus vaqueiros e tangerinos, por nossas estradas, com o gado, tão submisso aos seus “aboios”, “canto sem palavras, marcado exclusivamente em vogais, finalizando com uma frase de incitamento à boiada e legítima melodia em neumas, recordando a prece da tarde, caindo do alto dos minaretes” (Luís da Câmara Cascudo, “Mouros e judeus na tradição popular do Brasil”, 1978). Entende também aquele velho mestre que o “aboio” aqui chegou, vindo dos escravos mouros da Ilha da Madeira, trazido pelo português. Não conhece o vocábulo em documento anterior ao século XIX, acreditando que o nome é brasileiro e levado ao reino “em nossa acepção”, porque lá “aboiar” é deitar água abaixo, marcar com boia, tornar fluente, alijar, como é registrado por João de Barros e Diogo Couto e, em sentido diferente, não o empregou o Padre Antônio Vieira. [...] O último chapéu de couro que vi em “Rio Branco”, faz 8 ou 9 anos. “Nascido com o desbravador destemeroso da caatinga e que o acompanhou sempre em sua aventura de gigante”, usava-o Bonifácio, sobrinho de Zé Pereira, de Manuel Quinca do Xilili e de D. Etelvina, senhora do cel. Félix de França, do Brejo de São José, em Buíque. Nossas estradas (a partir de 1932), o automóvel, o caminhão, o rádio, a televisão, como que estão deixando apenas do sertão de outra época, as serras distantes e azuis, que estas serão sempre as mesmas ou nunca mudarão, como não mudam o mar e o céu.»
6-10-1920 - A Província. goo.gl/6N27ei,   col. «Alagoa de Baixo, 5 (Do nosso correspondente especial) - Nas imediações da vila de Samambaia, deste município, foram assassinados e roubados um boiadeiro e dois portadores quando regressaram da feira de gado, da vila de Rio Branco. Depois de perpetrado o hediondo crime, o grupo homicida evadiu-se. O destacamento daqui é insuficiente para fazer o policiamento do município que é vasto.»

08-10-1920 - A Província, goo.gl/L8Quap, 7ª col. «Os horrores do sertão. Escreve-nos o sr. Eneas Gomes dos Santos, datando sua carta de Rio Branco, em 5 de outubro. […] Tendo vindo a esta localidade vender uma boiada, tive que me demorar por alguns dias, fazendo porém voltarem os meus tangerinos […] pernoitaram na proximidades do lugar denominado Jeritacó, a 16 léguas de Rio Branco, dois dias depois foram encontrados todos os três mortos […]. São tantos os grupos de degenerados salteadores que operam nas estradas, de modo a não se saber a quem atribuir a prática do delito. […]. Por aqui lamento o não ter a quem peça ao menos garantia para regressar ao sertão, pois a vila de Rio Branco, apesar de ser o centro mais comercial dos sertões de Pernambuco, um lugar com mais de dois mil habitantes, não dispõe de uma só praça de polícia que assegure a garantia pública. Os grupos de malfeitores, cruzam os caminhos com a curta distância de um quilômetro a esta localidade, pois contam com a proteção escandalosa dos políticos dominantes nos vizinhos municípios de Buíque e Alagoa de Baixo; não é de se admirar que em breve eles venham efetuar a “cobrança de impostos” dentro desta florescente vila Rio Branco.»

19-12-1923 - Jornal Pequeno. goo.gl/6d2ZrM ,  6ª col. «Prefeitura do Recife. Nota oficial. […] o prefeito ter recebido resposta de consulta, enviada aos prefeitos de Garanhuns, Pesqueira [no então distrito Rio Branco], Caruaru e Vitória, localidades onde há feiras de gado […].»
1926 - 21-10-1934 - Diário da Manhã, tinyurl.com/y8yhp56y , 2ª col.
«Em uma tarde de outubro de 1926, Lampeão com sua horda assaltou na fazenda Juá, do município de Floresta, um cercado onde pastavam 127 bois, pertencentes a um meu parente, destinados à feira de gado em Rio Branco, abatendo todos a balas, como uma torpe vingança, pelo fato de haver o seu dono se recusado a lhe fornecer munições e dinheiro.»

05-06-1928 - Jornal do Recife, goo.gl/SDYqzf,    col. «Sertão em fome. […]. Quem assiste à uma feira de gado em Rio Branco, desola-se em ver a que estado está reduzida a nossa pecuária, não há uma só boiada gorda do nosso Estado, alguma partida de gado melhor é de origem baiana, essa mesma não pode chegar em boas condições, pois desde que passa para o nosso Estado nada encontra que comer, há travessias de 3 e 4 dias de caminhadas onde nem água para o gado existe. […].»

01-02-1929 - Jornal Pequeno, goo.gl/LVVdJU, 3ª col. «[…] Desses dados, colhe-se que não tem havido feira de gado em Rio Branco, suprindo-se o Recife em Caruaru e Itabaiana. A feira de Caruaru não pode fornecer semanalmente mais de duzentas cabeças, distraídas a terça parte para alguns municípios próximos. A de Itabaiana não oferece margem apenas para 150 cabeças, que estão sujeitas a um novo imposto de trânsito de 13500 por cabeça […].»

11-06-1931 - Jornal Pequeno - goo.gl/UnL71i ,1ª col. «[…] Viajei do Recife a Rio Branco de automóvel - quatorze horas de martirizante viagem com duas pequenas paradas, uma na Vitória, para saborear o delicioso café do sr. Nestor & Holanda e outra em Caruaru, para o almoço no Grande Hotel. Manhã chuvosa, estradas ruins, chegamos felizmente vivos ao Rio Branco, onde tivemos fidalga hospedagem do sr. Getúlio Cézar, no Campo de Sementeira. […] No Rio Branco sente-se frio. Um frio delicioso, que me faz recordar o da primavera na América do Norte. Os campos estão verdes, o que dá ao sertão uma tonalidade de beleza e de alegria, em contraste à seca, que é o comum. Assisti a uma feira de gado. Quatrocentas cabeças, quase todas provenientes do norte da Bahia e do sul do Piauí. Pernambuco quase não tem pecuária. O gado passa a noite nos currais da municipalidade para ser pesado no dia seguinte. É uma exigência do comprador. Passa a noite preso, para que não coma, não beba nem se enlameie, a fim de não aumentar o peso. A balança é como as das usinas. Tange-se um lote para a balança, verifica-se o peso e abre-se a porta. À saída um indivíduo com ferro em brasa vai marcando com um número, uma por uma, cada rês pesada. Ao contato inesperado do ferro em brasa no pescoço o animal salta, escoiceia, urra e corre. Grande parte do gado de hoje foi adquirida pela firma André Bezerra, a razão de seiscentos e poucos réis o quilo, para o matadouro do Recife. O vendedor explica-me: o gado em pé dá apenas 50% de carne verde para o mercado, de modo que vendido a 600 réis corresponde a 1$200. - E o couro? e as unhas? e os chifres? e os ossos? e as fressuras? - interrogo. Tudo isto se vende no Recife, onde a carne está a 2$000. Vende-se, sim senhor, como também se vende o cabelo da cauda. É o lucro do matador. Por onde se vê a carne verde, não é mau negócio, pois, além do lucro da venda do couro, de chifres, de unhas, de fressuras etc. que nada custa, os arrendatários do matadouro cobrem-se com mais 60%, quando, por gentileza, nos vendem a carne com osso por 2$000. Mário Melo.»

08-12-1933  Diário de Pernambuco, goo.gl/9bmF45, 3ª col. «- Feira de gado de Rio Branco. O Sertão Jornal tratando de interesses da hinterlândia, registra novas iniciativas do governo municipal do Rio Branco.
Assim, depois de dar aos seus leitores notícia da inauguração, no próximo domingo da barragem do Salobro, ˜trabalho de alto alcance às necessidades locais. notadamente para a classe pobre, dos que não podem pagar 2$400 por uma carga de quatro latas d’água˜, - faz o seguinte registro:
˜Rio Branco é o centro de convergência das grandes ˜boiadas” que procedem do Piauí e da Bahia, sendo por isso grandemente movimentada a nossa “feira de gado”, que se realiza às quartas-feiras.
Localizada numa grande área do “bairro do Cuscuz”, o referido comércio de rezes é bastante concorrido pelos interessados.
A Prefeitura Municipal, por iniciativa do operoso chefe do executivo, o sr. dr. Luiz Coelho, atendendo ao acentuado movimento daquela feira, está construindo ali um amplo pavilhão de abrigo para os feireiros livrando-os de resolverem suas transações comerciais no campo livre, expostos ao sol causticante ou aos rigores dos dias invernosos.
É este mais um melhoramento de utilidade e que está sendo acolhido com muita simpatia.»

29-12-1933 - Diario de Pernambuco - goo.gl/hmi4go, 2ª col. «Melhoramentos em Rio Branco. A população de Rio Branco assistiu, festivamente, à inauguração dos novos melhoramentos municipais.
A barragem do Salobro, distante três quilômetros da cidade, tem capacidade para trezentos mil metros cúbicos d’água, estando o serviço de fundação do aterro com um volume de cerca de 3.770 metros cúbicos de matéria de boa qualidade.
O sangradouro é de alvenaria, defendido por uma placa de concreto armado.
No bairro do Cuscuz está o pavilhão da feira de gado com trinta e seis metros quadrados de área.
O Sertão Jornal, registrando essas inaugurações, diz:
“Melhoramentos de positiva utilidade pública tanto a barragem do Salobro como o pavilhão de feira de gado, atestam e concepção clara do ponto de vista administrativo com que vai o dr. Luiz Coelho governando o município, cuja estabilidade econômico-financeira é também uma afirmação que honra a um povo e dignifica a um governo.»

31-07-1938 - Diario de Pernambuco , goo.gl/cTTLyy, 2ª col. «-  […] Rio Branco - antigo centro comercial que vem cedendo lugar à Alagoa de Baixo. Estamos na zona da criação, do mocó e do caroá.
Fomos à feira de gado. A pecuária ali não é tratada de modo tão estúpido como nas bandas do oeste do Estado. A fazenda de criação que o governo mantém em Rio Branco já educou um pouco o fazendeiro daqueles mundos, que vai compreendendo a necessidade do zebu”. Os corumbás, na feira de gado falam nesses nomes ainda considerados difíceis para muitos fazendeiros zebu, gir, nelore, guzerá, gado puro, mestiço e uma porção de coisa que ouviram do veterinários do Estado e acham direito. Pegamos uma explicação pitoresca dum vendedor de gado:
-“Qué comprá, é zebu. Esse bicho é duro de morrê na seca qui nem jumento. Si o sinhô levá um desse prá fazenda, nunca mais tem garrote merim, feito gado criôlo”. […].»

23-04-1939 - Diario de Pernambuco, -  goo.gl/GBDPRn, 1ª col.  «- […] Porque o sertão está seco e os rebanhos perecem de fome e de sede é que continuamos a importar, largamente, gado em pé dos estados vizinhos. Ainda na última quarta-feira, em Rio Branco, na feira de gado, onde havia 700 rezes, 10 eram de Pernambuco. O mais tinha vindo dos sertões baianos, através de fatigantes caminhadas.” As estatísticas oferecem ao estudioso dos problemas econômicos pernambucanos conclusões muito interessantes. E estas clamam pelo aproveitamento da zona sertaneja. Porque o litoral e a mata é que sustentam nossas exportações. No dia em que o governo federal se dispuser a realizar o plano em estudos de aproveitamento do São Francisco, então assinalaremos para Pernambuco um surto de verdadeira renovação.»

Foto do Diário de Pernambuco, 18-08-1945: “Tipo característico do vaqueiro da região”.

18-08-1945 - Diário de Pernambuco - goo.gl/gTuKYg, 2ª col.  «A feira de gado de Arcoverde. Arcoverde é um município que fica a 270 kms do Recife, à margem da estrada de ferro é cortada por estradas de rodagem. É uma cidade das mais movimentadas do interior do estado, em vista de sua posição. Toda gente que vai ou vem do alto sertão, gente que vem de certos municípios da Paraíba, Alagoas, Bahia, Goiás, Minas, Sergipe e outros estados passa por Arcoverde. É muito conhecida a feira de gado que se realiza ali, às quartas feiras. Afim de assistir a uma dessas feiras, a reportagem do DIARIO viajou esta semana para aquela cidade do interior.
Chegamos na terça-feira, à noite, e o movimento de criadores e boiadeiros já era grande. Viam-se, pela cidade, muitos tangeres, com sua vestimenta característica: alpercatas, chapéu de couro, um cacete e toda sua bagagem em torno do corpo, formando o que eles chamam o “malote”.
Milhares de animais. Os negócios se realizam, geralmente, na tarde da quarta-feira. Foi nessa ocasião que estivemos na feira. No fim da rua Augusto Cavalcanti ficam os currais. Uma enorme área, divididas em diversos currais - mais de 20 - fica apinhada de gado. Nada menos de 2.500 bois foram levados para a feira de gado de Arcoverde, no último dia 15. E quem viu, como nós, tanto boi junto, exposto à venda, fica pensando, sem encontrar explicação, porque havendo tanto gado ali, a população do Recife sofre tanto por falta de carne de boi. Vimos, ali, animais morrendo, cansados ou doentes das longas caminhadas. E chegamos a uma conclusão paradoxal, enquanto no Recife quase se morre de fome, por falta de carne de boi em Arcoverde os bois morrem e não tem quem os compre. Diante da quantidade de animais que vimos, procuramos saber se em todas as feiras a quantidade de gado era assim tão grande. Informaram-nos de que todas as quartas feiras o movimento era aquele. Na penúltima quarta-feira, dia 8 por exemplo, a quantidade de gado foi uma das maiores dos últimos tempos. Cerca de 3.000 bois. Na quarta-feira última, mais ou menos 2.500. E é assim toda quarta-feira.[…].»

20-08-1955 - Diário de Pernambuco, goo.gl/hyVKMh, 5ª col. «Falou o sr. Ney Maranhão. O orador seguinte foi o sr. Ney Maranhão. Afirmou que, na última feira de gado em Arcoverde, no dia 17 do corrente, comprara, ele pessoalmente, 714 bois, a diferentes preços, variando no mínimo de 280 cruzeiros ao máximo de 326 por arroba. Apresentou uma relação detalhada da compra feita, indicando a quantidade de cada partida comprada, o preço, o nome do vendedor e a origem do gado. Afirmou que o gado mais caro custa 328 cruzeiros a arroba. Tratava-se de animais de primeira qualidade, procedentes da Bahia e com mais de 10 arrobas cada um.»

17-09-1957 - Diario de Pernambuco, goo.gl/2YpNXi, 6ª col.  «Arcoverde, vende-se boa propriedade, distante 14 quilômetros da maior feira de gado do estado [...].

11-04-1983  - Diário de Pernambuco -goo.gl/KpczJF, 3ª col. «Como medida que poderá incentivar o maior desenvolvimento da pecuária, o prefeito pretende promover o funcionamento da “Feira de Gado”, que há 30 anos deixou de ser realizada em Arcoverde  e que era considerada como a maior do estado, Para isso, ele manterá contatos com a direção regional do Banco do Brasil, no sentido de assegurar crédito mais fácil aos pecuaristas. O gado, atualmente, é vendido em Caruaru.»












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