Primórdios do sertão nordestino
Jornal de Arcoverde - Julho/Agosto de 2012 - Página 3
Primórdios do sertão nordestino
Pedro Salviano Filho
Nesta edição, procura-se observar um sertão nordestino
habitado pelos primeiros homens na época do descobrimento e, depois, o início
da colonização brasileira pelos primeiros portugueses. Assim, teremos os passos
iniciais para, talvez, justificar alguns dos nossos comportamentos
contemporâneos.
Todas
as fontes da história do território hoje conhecido como Brasil, antes da
chegada dos europeus, são arqueológicas (O Brasil antes dos brasileiros: a pré-história do nosso
país. Jorge Zahar Editor. Rio-RJ. 2007.
2ª. Edição. Por André Prous. Pág.13. Na web http://bit.ly/P6aa9c).
O livro de Gabriela Martin Pré-história do Nordeste do Brasil. (Ed. Universitária da UFPE, 5ª
edição. 2008 - 434 p. na web em http://bit.ly/LURYic) documenta na pág.66: «Os
primeiros homens que chegaram ao Nordeste brasileiro eram, pelos dados que até
agora possuímos, como os índios atuais. Racialmente pertenciam a grupos
mongoloides como, aliás, todos os habitantes das Américas anteriores à
colonização europeia. Dentro das naturais variedades, existe, portanto, uma homogeneidade
indiscutível nos diferentes grupos humanos brasileiros, o que identifica todos
os índios sul-americanos como oriundos de uma mesma origem. Mas, se os
primeiros habitantes já haviam chegado ao Piauí por volta de 50000 anos,
poderia tratar-se de grupos pré-mongoloides que evoluíram já nas Américas ou
que se extinguiram.
Admite-se que os índios
brasileiros chegados ao Nordeste são os descendentes de levas arcaicas, que
atravessaram o estreito de Bering alguns milhares de anos antes. Mesmo que,
periodicamente, levante-se a conjetura da existência de outras vias de acesso,
que poderiam ter dado lugar à chegada na América de grupos humanos em épocas
pleistocênicas, nada pode ser provado até o momento».
Tradição
Agreste, sub-tradição Cariris-velhos. A
Pedra do Tubarão e o Cemitério dos
Caboclos, em Venturosa, PE,
formam parte da mesma estrutura arqueológica, com antropomorfo isolado e
grafismos puros tipo "carimbo", típicos da tradição Agreste (Pág. 276).
Tradição
Agreste. Grafismos tipo “carimbo”, frequentes na sub-tradição Cariris Velhos, Pedra da Buquinha,
Venturosa, PE. Nordeste do Brasil (Pág. 277).
Tradição
Agreste, sub-tradição Cariris Velhos, Sítio
Alcobaça, Buíque, PE. Antropomorfos isolados e grafismos puros. Nordeste do
Brasil (Pág. 283).
Imagens e legendas
tomadas do livro de Gabriela Martin Pré-história
do Nordeste do Brasil. Ed. Universitária da UFPE, 5ª. Edição. 2008 - 434 p.
No livro Cronologia
pernambucana. Subsídios para a história do agreste e do sertão, 1º volume.
Centro de estudos de história municipal/FIAM – 1982, Nelson Barbalho escreve na
pág. 34 – «Os Cariris são os primeiros habitantes conhecidos do agreste e do
sertão de Pernambuco. Desse grande povo, cujas origens ficaram aqui rapidamente
esboçadas, vêm as nações dos Carapotós, Xucurus, Carnijós, Pankararus,
Paratiós, Anchus, Pipipães e mais gentes que dariam vida e movimentação às
terras agrestino-sertanejas muitos séculos antes da invasão dos brancos
portugueses e dos negros africanos, e, por direito de conquista, seriam os seus
mais legítimos donos».
Na pág. 114 do mesmo volume ele registrou: «Em
1º de novembro de 1549, Tomé de Souza, - primeiro governador-geral do Brasil,
mordomo-mor de El-Rei,... declara instalada a nova cidade de Salvador ... Tomé
de Souza fundava engenhos-de-açúcar e desenvolvia sobremodo a pecuária,
introduzindo nas fazendas brasileiras o gado trazido de Cabo Verde. Baseado nos
regimentos que o nomearam para o exercício do cargo de governador-geral,
proibia a escravização e o saque dos gentios, salvo quando sob licença do
governo ou dos respectivos capitães-mores; estabelecia feiras semanais nas
vilas e povoados, nas quais os indígenas pudessem concorrer, regularmente,
comprando, vendendo ou escambando produtos diversos; autorizava a exploração e
povoamento de terras pelo sertão, para o que enviava bergantins pelo rio São
Francisco principalmente, seguindo tais expedições com línguas (intérpretes) e
guias, pondo marcos nos pontos já descobertos e tomando posse das terras que se
descobrissem; não permitia que ninguém penetrasse ou se comunicasse, pelo
sertão, de uma para outra Capitania, sem estar prévia e devidamente autorizado;
obrigava os capitães, fazendeiros e senhores-de-engenho, para defesa própria e
de suas povoações, a armarem-se fortemente e a construírem, nos seus redutos,
torres e casas-fortes (de tal obrigação nasceriam o coronelismo brasileiro, a
capangagem e, mais tarde, o cangaceirismo nordestino, bem como o uso
indiscriminado do bacamarte, do qual adviriam os populares bacamarteiros das
caatingas do Nordeste); e, além de outras providências salutares, decidia
intervir nas administrações de todas as Capitanias ao longo da costa,
visitando-as sistemática e pessoalmente, acompanhado pelo provedor-mor, .... ».
No primeiro século da colonização brasileira, alguns
aventureiros escreveram sobre as peripécias aqui vividas. Por exemplo: 1557 - Hans Staden: Viagens e aventuras no Brasil; 1558 - André Thévet: Singularidades da França Antártica; 1567 - Ulrico Shmidel : História verdadeira de uma viagem curiosa
feita por U. Shmidel; 1578 -
Jean de Léry: Viagem a terra do Brasil.
Hans Staden, que aqui esteve por duas vezes, de volta à Europa redigiu uma das
primeiras descrições para o grande público sobre os costumes dos nossos índios.
Seu livro, VIAGEM AO BRASIL (Versão
do texto de Marpurgo, de 1557, por Alberto Loforen, revista e anotada por
Theodoro Sampaio, Publicações da Academia Brazileira, 1930), pode ser
integralmente lido em http://purl.pt/151/1/P1.html . Já o filme (1999), que mostra sua segunda viagem ao
Brasil, está em: https://www.youtube.com/watch?v=Ih-SKQ3qzas .
Para os leitores que apreciem o assunto e desejem mais
informações, interessantes livros com crônicas da terra brasileira daquele
século também estão disponíveis para consulta na web: História da Província Santa Cruz a que vulgarmente chamamos Brasil,
feita por Pedro de Magalhães de Gandavo, editado em Lisboa, em 1576: http://bit.ly/PnaGA0. De Gabriel Soares e Souza: Tratado Descritivo do Brasil, de 1587: http://bit.ly/R5mc8Y e Narrativa epistolar de uma viagem e missão
jesuítica pela Bahia, Porto Seguro, Pernambuco, Espírito Santo, Rio de Janeiro,
S. Vicente, (S. Paulo), etc. desde o ano de 1583, do Padre Fernão
Cardim: http://bit.ly/OHGLpu.
Em Viagem incompleta –
Formação – Histórias: A Experiência brasileira
(1500 - 2000). Editora Senac-SP. 3ª Edição. 2009 – Organizado por Carlos
Guilherme Mota (Na web em http://bit.ly/SXnHEy
- Aziz Nacib Ab´Sáber, analisando as «Incursões à pré-história da
América tropical», na pág. 42 diz: «Os
povos de língua tupi-guarani que vasculharam e fizeram migrações sucessivas e
progressivas por milhões de quilômetros do território tropical e subtropical da
América do Sul caracterizam-se por forte adaptabilidade aos domínios de
florestas, ao uso dos rios, incluindo moradias e tabas construídas em pontos de
diques marginais e sítios de baixos terraços. Desalojando, finalmente, os
homens dos sambaquis fixados em beira de restingas, adaptados a viver da pesca
e coleta de "frutos do mar". Expulsando e sobrepondo-se belicosamente
aos viventes dos sistemas lacunares estuarinos, os tupis incorporaram pela
primeira vez, na pré-história brasileira, toda a faixa litorânea frontal do
país, tendo por preferência barras de rios e riachos encostados em morretes ou
maciços costeiros florestados. E chegaram até a Amazônia.
Foi neste contexto de
ocupação, bastante generalizada dos povos de língua tupi-guarani, que os
colonizadores caucasoides, procedentes da Europa Ocidental, entraram em contato
com os povos indígenas de origem mongoloide. Um contato que redundou em vasta, complicada
e desumana letalidade. Ainda que por alguns séculos o país tenha vivido uma
plena proto-história. Do que resultou uma trágica eliminação étnica, a par com
uma miscigenação gradual - envolvendo índios e negros, forjadores de um povo
diversificado e maravilhoso, permanentemente pressionado pela insensibilidade
do invasor, alheio às desigualdades sociais e aos atributos eternos da ciência
e da cultura.
Dominados por
latifundiários, comandados por elites insensíveis e uma tecnoburocracia
incompetente e pouco criativa. Por um capitalismo hipócrita e uma nefasta
pseudoglobalização».
Para complementar essas observações sobre a origem do
povo brasileiro, recorremos ao antropólogo Darcy Ribeiro (1922-1997), na sua
obra final, publicada em 1995, pouco antes da sua morte: «O povo brasileiro. A formação e o sentido do Brasil» (Companhia das Letras, São
Paulo-SP, edição de 2008, ver obra completa em http://bit.ly/Qjjnz9). Este livro trata das matrizes culturais e dos
mecanismos de formação ética e cultural do povo do Brasil, onde o antropólogo
aborda a história da formação do povo brasileiro, sua origem mestiça e a
singularidade do sincretismo cultural que dela resultou.
Na
página 53 podemos ler: «Em
poucas décadas desapareceram as povoações indígenas que as caravelas do
descobrimento encontraram por toda a costa brasileira e os primeiros cronistas
contemplaram maravilhados. Em seu lugar haviam se instalado três tipos novos de
povoações. O primeiro e principal, formado pelas concentrações de escravos
africanos dos engenhos e portos. Outro, disperso pelos vilarejos e sítios da
costa ou pelos campos de criação de gado, formado principalmente por mamelucos
e brancos pobres. O terceiro esteve constituído pelos índios incorporados à
empresa colonial como escravos de outros núcleos ou concentrados nas aldeias,
algumas das quais conservavam sua autonomia, enquanto outras eram regidas por
missionários».
Na página 68: «No Brasil, de índios e negros, a obra
colonial de Portugal foi também radical. Seu produto verdadeiro não foram os
ouros afanosamente buscados e achados, nem as mercadorias produzidas e
exportadas. Nem mesmo o que tantas riquezas permitiram erguer no Velho Mundo.
Seu produto real foi um povo nação, aqui plasmado principalmente pela
mestiçagem, que se multiplica prodigiosamente como uma morena humanidade em
flor, à espera do seu destino. Claro destino, singelo, de simplesmente ser,
entre os povos, e de existir para si mesmos».
Dez vídeos que compõem
os respectivos capítulos desse interessante livro podem ser acessados:
Matriz Tupi
- Cap.1: https://www.youtube.com/watch?v=rQOPdiEdX24
Mais artigos desta coluna: https://bit.ly/2TvZHPX
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